Todo o salseiro por conta do habeas corpus preventivo do Lula, não passou de fumaça. O STF anteontem não julgou nada, não reviu nada, continou produzindo inutilidades. Como guardião da Lei Maior, o nosso “livrinho”, deveria ter apreciado a questão mais importante que lhe foi posta: o texto constitucional deve continuar a ser violado, admitindo-se a prisão sem trânsito em julgado? Verdade que a tal situação não poderia ser apreciada no malfadado HC e, por isso mesmo, deveriam ter pautado e julgado de uma vez essa malsinada interpretação nas 2 ADC’s.

 

Em verdade, quando prolataram uma decisão em 2016, “flexibilizando” a Constituição, “jogaram pra galera”; talvez impulsionados por um dos seus então membros com claras aspirações políticas. No entanto, caíram numa armadilha. Não se brinca com a lei. Ao decidir sobre o que não podiam decidir criaram mais incertezas e trevas. Mostraram que nosso estado democrático de direito não é nem democrático e nem de direito.

 

Aos ministros do STF cumpria apenas aplicar a constituição, sem mascá-la. Qualquer leitura obtusa que distorça seu texto é evidente desvio e põe em xeque o estado de direito e a democracia. Quem muda a lei é o legislativo, não o judiciário. Mudar a lei sem passar por aqueles que detém o poder delegado pelo povo para tal fim é solapar o poder popular.

Não é muito diferente de general que diz que as armas estão atentas…

Estado de direito exige que todos, todos, inclusive os juízes, cumpram a lei.

Todavia, quando achamos que vimos tudo…

O que aconteceu ontem foi exatamente o que não se pode permitir ou desejar: que julguem pela temperatura da água, no sabor dos ventos. Moro, assumindo um protagonismo estranho, que nos leva a crer que também atua como político e não juiz, atropelou o rito processual e decretou a prisão de Lula. Não esperou nem o trânsito em julgado dos embargos no TRF4. Notem que essa coisa de descumprir a lei é uma mania…um vício…

Não importa quem é o réu, não importa o que pensa a opinião que publica. O que realmente deve ser preservado é a certeza de que, sem se olhar à quem, a lei será aplicada.

O ambiente está tão conturbado que estamos esquecendo o porquê das garantias constitucionais: evitar que sejamos massacrados, em qualquer tempo, pelas estruturas de estado.

Temos sim que combater o mal, mas não com um mal maior. Se queremos que os ímpios sejam punidos, devemos ter certeza que o serão de forma justa e o justo, num estado de direito, significa dentro da lei. Não podemos justificar o não cumprimento da lei por conta da demora em aplicar a lei. Devemos exigir que o estado faça cumpri-la no tempo razoável, sempre.

Triste que tenhamos resumido tudo isso à uma sede de vingança; que em nome da “eficácia” estejamos sacrificando, novamente, as vidas daqueles que, ao longo da história, deram suas vidas para que pudéssemos hoje estar aqui falando em garantias individuais.

Esperemos, singelamente, que um sopro de lucidez tome nossos julgadores e que, desta maneira, percebam a importância do seu papel num estado de direito.

Moro, no seu afã de prender, de assumir a ribalta, dá a vitória à Lula. Muitas vezes me pergunto se Moro não é petista. Porque tamanha burrada jurídica, tamanho açodamento só pode ser feito para ajudar alguém que, do ponto de vista fático político não tinha salvação. Moro lhes deu a saída: Lula e seus seguidores poderão dizer (aos quatro ventos, inclusive na ONU e OEA) que foi vítima de uma perseguição, de um processo que não observou a lei. De réu/vilão, vira vítima.

Perfeito!

Lula venceu.

 

Marcus Vinicius Ramos Gonçalves

Sócio da Bertolucci e Ramos Gonçalves Advogados. Prof. Convidado da Pós-Graduação da FGV-RJ. Presidente da Comissão de Estudos em Comunicação da OAB/SP. Presidente do ILADEM (Inst. Latino-Americano de Defesa e Desenvolvimento Empresarial).

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