Fiz-me silente. Preferi acompanhar o deslinde do segundo turno assim, quieto. Em verdade, estava estarrecido, boquiaberto. Ânimos exaltados, cá e lá. Ainda que não me encaixasse nem cá e nem lá, senti-me pressionado. Vi alguns colegas discutindo, no sentido pejorativo da palavra, em redes sociais, sem limite ou respeito. E o pior: de lado a lado, dizendo-se democratas.

 

Vem o dia do sufrágio e as urnas carimbam o que o as pesquisas diziam (e o “deus” mercado já tinha precificado). Duas horas depois do fim da votação, a “festa da democracia” se fazia completa, estava findada a apuração.

 

Democracia. Que democracia?

 

Parecemos uma democracia, mas estamos longe dela. Nosso modelo pseudodemocrático reduz nossa participação à, de dois em dois anos, escolhermos “representantes” para gerir e criar regras (para tudo…). Pessoas que escolhemos e, na grande maioria das vezes, não travamos qualquer contato, não recebemos qualquer informação, não discutimos rumos e nem nossas necessidades. São por assim representantes de gente que não se sente representada. Aliás, nesse quesito, um parêntesis: esta foi a eleição em que, justamente por não nos sentirmos minimamente representados, surgiram outros nomes, alguns novos, todavia, em boa parte conectados com redes e grupos sociais. Voltando ao tema que pretendo debater, qual conexão que nos resta com os eleitos após a eleição? De onde tiram suporte e referência para suas condutas?

 

Em verdade, nesta eleição de forma mais acentuada, não debatemos ideias, projetos ou metas. Escolhemos lastreados em discursos vazios, que versam a mais de 100 anos sobre as mesmas coisas: saúde, educação, segurança e emprego.

 

No entanto, como ficamos desconectados deles, os eleitos, passado o pleito não temos qualquer controle sobre o que fazem nossos “representantes”.

 

Já começamos a ouvir sobre a reforma previdenciária, sem que tenhamos discutido o que é de verdade o rombo que deve ser combatido, já que esta interessa ao “deus” mercado e alguns de seus sacerdotes (que ficaram ainda mais ricos constituindo imensos fundos de previdência privada). Qual será próxima reforma?

 

Com muita franqueza, gostaria de poder discutir temas que impactassem no aprimoramento desse processo de interação entre eleitos e eleitores, mais exatamente em mecanismos efetivos de controle dos últimos sobre os primeiros. Creio que mais do que oportuna, é a hora de falarmos de reforma política. Quem sabe num Congresso relativamente novo, ainda não picados pelo mosquito do poder, possamos realmente mudar os rumos do nosso processo político e, com isso, criar uma verdadeira e radical mudança em nossas relações com o Estado e, quiçá, com a própria sociedade.

Particularmente, creio que um regime democrático demanda a participação direta do povo, não apenas escolhendo seus representantes para exercício de funções de poder, mas também opinando diretamente sobre temas que tange suas vidas privadas. Nesse sentido, gostaria de ver debatida a adoção do voto distrital puro, com a divisão dos municípios em distritos municipais, dos estados em distritos estaduais e do país em distritos nacionais. Cada distrito elegeria seus representantes, e cada distrito fomentaria o debate sobre gastos e arrecadação, de forma que o nosso dinheiro fosse arrecadado e aplicado na exata dimensão do que cada distrito entende ser necessário. Querem construir uma creche? Os habitantes do distrito em que será construída a creche vão pode opinar, via seu representante eleito, a necessidade real da construção daquela creche, naquele local, por aquele preço. Fica muito mais difícil usar mal o dinheiro público assim. Querem dar auxílio isso ou aquilo? Os habitantes de cada distrito vigiarão o voto do seu representante, que de alguma forma é seu vizinho, e certamente se constrangerá em votar a favor da instituição ou manutenção de privilégios. Nessa mesma intelecção, coisas como “carro oficial” pra lá e pra cá sumiriam, pois se seu vizinho o visse chegando de carro oficial rapidamente colocaria na web e adeus o respeito ao representante.

Em verdade, aumentamos assim o controle social sobre nossos representantes…

 

Mais ainda: com o voto distrital, os eleitores poderiam fazer um recall eleitoral, toda vez que percebessem que o representante escolhido se desviou daquilo que era o esperado como sua conduta. Esse recall, poderia ser formulado a pedido de um número qualquer de eleitores do distrito, de maneira que o mandato não virasse uma procuração com poderes ilimitados por 4 anos.

 

Ainda na mesma intelecção, podemos debater o fim da reeleição de forma ilimitada para o legislativo, criando um limite de reeleições (dois ou três mandatos consecutivos…), bem como, acabando com a reeleição para o executivo.

 

Tudo isso proporciona mudança e controle.

 

Mas, esperem: falta o judiciário. Essa “caixa preta” chamada judiciário, já que é função de poder, tem que ter seus membros escolhidos pelo povo da comarca (distrito). Já imaginaram os juízes tendo que prestar contas de sua atuação como servidores públicos à população?

 

Democracia é assim, com o povo no poder, opinando, controlando, participando.

 

Democracia não é apenas apertar um botão, a cada dois anos, de uma arapuca eletrônica. Tampouco uma corrida de cavalos porque, se o fosse, os cavalos seríamos nós.

 

PS: o herói nacional, ganhou superpoderes…tornar-se-á superministro, para depois virar ser supremo. Ainda que o seu trabalho seja importante para o debate do combate à corrupção, sempre o critiquei porque acreditava que como juiz, não poderia ter lado e agir como ator político, pois isso mancharia a neutralidade que se espera de um magistrado. Infelizmente, picado pelo “bichinho”, mostra que não era juiz e sim agente político. Com isso, dá munição aos corruptos…

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